A TRANSIÇÃO PARA A ECONOMIA CIRCULAR: UMA ABORDAGEM ECOLÓGICA E SUSTENTÁVEL PARA COMBATER A POBREZA E PROMOVER O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A TRANSIÇÃO PARA A ECONOMIA CIRCULAR: UMA ABORDAGEM ECOLÓGICA E SUSTENTÁVEL PARA COMBATER A POBREZA E PROMOVER O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

1 de junho de 2023 Off Por Scientia et Ratio

THE TRANSITION TO A CIRCULAR ECONOMY: AN ECO-FRIENDLY AND SUSTAINABLE APPROACH TO FIGHT POVERTY AND PROMOTE SUSTAINABLE DEVELOPMENT

Artigo submetido em 10 de janeiro de 2023
Artigo aprovado em 25 de janeiro de 2023
Artigo publicado em 01 de junho de 2023

Scientia et Ratio
Ano III – Número 4 – Junho de 2023
ISSN 2525-8532

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Autor:
Markus Samuel Leite Norat[1]

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RESUMO: Este artigo explora a transição para a Economia Circular (EC) como um mecanismo para combater a pobreza e promover o desenvolvimento sustentável. Em contraste com a economia linear, o modelo de EC busca manter o valor dos produtos, dos materiais e dos recursos pelo maior tempo possível, minimizando a geração de resíduos. Através de uma abordagem holística, englobando inovações de negócios, design, tecnologias e políticas, a EC visa gerar benefícios ambientais, sociais e econômicos. Propõe-se que a transição para a EC é imperativa para o combate à pobreza e o desenvolvimento sustentável, já que otimiza o uso dos recursos, cria novas oportunidades econômicas e reduz a dependência de insumos não renováveis. Este trabalho examina os desafios e oportunidades da transição para a EC, discute a relação entre a EC e a erradicação da pobreza, e explora as oportunidades de desenvolvimento sustentável oferecidas pela EC. Ademais, o artigo apresenta estudos de caso de transição para a EC em diferentes setores e contextos. Este estudo contribui para a compreensão e promoção da EC como uma estratégia viável para combater a pobreza e promover o desenvolvimento sustentável.

Palavras-chave: Economia Circular; Desenvolvimento Sustentável; Erradicação da Pobreza; Transição para Economia Circular; Oportunidades Econômicas; Inovação em Negócios; Sustentabilidade.

ABSTRACT: This article explores the transition to the Circular Economy (CE) as a mechanism to combat poverty and promote sustainable development. In contrast with the linear economy, the CE model seeks to maintain the value of products, materials, and resources for as long as possible, minimizing waste generation. Through a holistic approach, encompassing business innovations, design, technologies, and policies, CE aims to generate environmental, social, and economic benefits. It is proposed that the transition to the CE is imperative for poverty alleviation and sustainable development, as it optimizes resource use, creates new economic opportunities, and reduces dependence on non-renewable inputs. This paper examines the challenges and opportunities of the transition to CE, discusses the relationship between CE and poverty eradication, and explores the sustainable development opportunities offered by CE. Furthermore, the article presents case studies of transition to the CE in different sectors and contexts. This study contributes to the understanding and promotion of CE as a viable strategy to combat poverty and promote sustainable development.

Keywords: Circular Economy; Sustainable Development; Poverty Eradication; Transition to Circular Economy; Economic Opportunities; Business Innovation; Sustainability.

INTRODUÇÃO

A última década foi marcada por profundas discussões sobre os caminhos que o planeta e suas populações devem seguir para garantir a existência de futuras gerações. No centro desses debates, temos a consolidação do conceito de Desenvolvimento Sustentável, que pressupõe uma integração entre crescimento econômico, responsabilidade social e cuidado ambiental. No entanto, uma nova abordagem se faz necessária, considerando que a estrutura linear da economia contemporânea, baseada no modelo “extrair-produzir-consumir-descartar”, tem se mostrado insustentável em longo prazo. Diante disso, o presente artigo busca examinar a transição para a Economia Circular, uma abordagem ecológica e sustentável para combater a pobreza e promover o desenvolvimento sustentável.

A Economia Circular (EC) surge como uma alternativa à economia linear, baseada em um modelo de produção e consumo que implica na recirculação de produtos, componentes e materiais no seu maior valor possível, em todas as etapas do ciclo de vida. Este modelo busca, portanto, manter o valor dos produtos, dos materiais e dos recursos pelo maior tempo possível, ao mesmo tempo em que minimiza a geração de resíduos. Trata-se de uma abordagem holística que engloba inovações em termos de negócios, conceitos de design, tecnologias e políticas, e que procura gerar benefícios ambientais, sociais e econômicos.

O presente trabalho parte do pressuposto de que a transição para a economia circular é imperativa para combater a pobreza e promover o desenvolvimento sustentável, já que permite otimizar o uso dos recursos, criando novas oportunidades econômicas e reduzindo a dependência de insumos não renováveis. Essa transformação implica uma série de desafios, desde a revisão de modelos de negócios até a reestruturação de cadeias de valor, passando por mudanças no comportamento do consumidor e inovações tecnológicas. No entanto, esses desafios devem ser vistos como oportunidades de promover a inovação, a eficiência e a criação de valor, tanto para as empresas como para a sociedade em geral.

A erradicação da pobreza, nesse sentido, não está dissociada da transição para uma economia mais sustentável e justa. Pelo contrário, a implementação de práticas de economia circular pode promover a inclusão social e a criação de empregos, além de melhorar a saúde e o bem-estar das populações mais vulneráveis. Além disso, a economia circular apresenta uma oportunidade única para repensar e redesenhar a forma como produzimos e consumimos, garantindo que o crescimento econômico seja sustentável e inclusivo.

A economia circular pode ser a chave para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pela ONU em 2015. Ao otimizar a utilização dos recursos, a economia circular contribui para a redução da pegada ecológica e para a promoção de um crescimento sustentável e inclusivo. Dessa forma, ela ajuda a responder aos desafios ambientais e sociais de nosso tempo, desde as mudanças climáticas até a perda de biodiversidade, passando pela crescente desigualdade econômica.

O objetivo deste trabalho é analisar as oportunidades e desafios da transição para a economia circular como meio de combate à pobreza e promoção do desenvolvimento sustentável. Para tanto, será feito um levantamento dos principais conceitos e características da economia circular, bem como uma análise de sua aplicação em diferentes contextos e setores. Além disso, serão explorados os benefícios e impactos desta transição para a sociedade, a economia e o meio ambiente.

1. ECONOMIA CIRCULAR E A SUSTENTABILIDADE

A Economia Circular (EC) é uma concepção moderna que diverge do paradigma da economia linear tradicional, caracterizada por uma mentalidade de “extrair, produzir, usar e descartar”. A EC, em contrapartida, preconiza um modelo econômico regenerativo e restaurador, onde o valor dos produtos, materiais e recursos é mantido na economia pelo maior tempo possível, e a geração de resíduos é minimizada (ELLEN MACARTHUR FOUNDATION, 2013).

Em termos gerais, a EC é um modelo econômico sustentável que visa reduzir o consumo e o desperdício de recursos naturais por meio de um ciclo de produção fechado, no qual os resíduos e subprodutos são reintegrados ao sistema produtivo. Isso significa que o design dos produtos e processos de produção devem considerar a reintrodução dos resíduos como recursos, tornando os processos produtivos mais eficientes e resilientes (BOONS et al., 2013).

Essa concepção de EC é frequentemente simbolizada por um diagrama de “borboleta”, proposto pela Ellen MacArthur Foundation (2013). As duas asas da borboleta representam os ciclos biológicos e técnicos. O ciclo biológico refere-se aos fluxos de materiais que, após seu uso, podem ser reintroduzidos na biosfera sem prejudicar a saúde dos ecossistemas. O ciclo técnico, por outro lado, envolve produtos e componentes que não retornam à biosfera, mas são projetados e comercializados para serem reutilizados, remanufaturados ou reciclados.

A EC é baseada em três princípios fundamentais, conforme descrito pela Ellen MacArthur Foundation (Towards the circular economy: Economic and business rationale for an accelerated transition, 2013): a) Preservar e melhorar o capital natural: Este princípio enfatiza a necessidade de controlar os estoques finitos e equilibrar a taxa de recuperação de recursos renováveis com a taxa de sua utilização. Na prática, isso significa desacoplar o crescimento econômico do consumo de recursos finitos e fazer uso otimizado de recursos biológicos. b) Otimizar a eficiência dos recursos: Esse princípio propõe o uso eficaz de todos os tipos de recursos, sejam eles materiais, humanos, financeiros ou energéticos. Isso é alcançado através de um design circular de produtos e processos, a promoção da reutilização, remanufatura e reciclagem, e a minimização do desperdício. c) Promover a eficácia do sistema: O terceiro princípio se refere à promoção de sistemas que sejam eficazes em termos de criação de valor. Na prática, isso significa evitar externalidades negativas, tais como emissões de gases de efeito estufa, poluição do ar, da água e do solo, e prejudicar a saúde e o bem-estar humano.

Estes princípios estão intimamente ligados aos conceitos de desenvolvimento sustentável e eficiência de recursos, e fornecem uma estrutura para transformar a forma como produzimos e consumimos bens e serviços. A EC, portanto, tem o potencial de oferecer soluções robustas para alguns dos desafios mais urgentes da nossa época, incluindo a escassez de recursos, a perda de biodiversidade e as mudanças climáticas. Além disso, ela abre novas oportunidades econômicas e pode contribuir para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

A interseção da Economia Circular (EC) e a sustentabilidade é inegavelmente profunda, fundamentada em princípios que defendem a preservação e a melhoria do capital natural, otimização da eficiência dos recursos e promoção da eficácia do sistema (ELLEN MACARTHUR FOUNDATION, 2013). A EC é, em sua essência, uma resposta estratégica e um instrumento de implementação eficaz para a sustentabilidade.

O conceito de EC é considerado uma abordagem revolucionária para alcançar a sustentabilidade, uma vez que rompe com a economia linear “extrair-produzir-descartar” e propõe um modelo que permite o uso de recursos de uma maneira mais eficiente e respeitosa ao meio ambiente (KORHONEN et al., 2018). Este modelo econômico circular e fechado propõe que a produção de bens seja realizada de tal forma que os resíduos sejam minimizados e idealmente eliminados, transformando-os em insumos através de uma eficiente reutilização, reparação, renovação e reciclagem de materiais e energia.

No cerne da EC está a necessidade de repensar nossos sistemas de produção e consumo, tornando-os mais eficientes e adaptáveis, não apenas para suportar a sustentabilidade ambiental, mas também para garantir a sustentabilidade econômica e social (Bocken et al., 2016). Isso implica um movimento em direção a modelos de negócios e padrões de consumo que sejam regenerativos por design e que aspirem a manter produtos, componentes e materiais em seu maior valor e utilidade em todos os momentos.

Em relação à sustentabilidade ambiental, a EC enfatiza a necessidade de preservar e melhorar o capital natural. A minimização do consumo de recursos, o uso eficiente de materiais e a redução da produção de resíduos não são apenas benéficos para o meio ambiente, mas também oferecem oportunidades significativas para a inovação e a eficiência econômica (Geissdoerfer et al., 2017).

Do ponto de vista econômico, a EC representa uma oportunidade de criar um novo modelo de crescimento econômico, um que seja desacoplado do consumo de recursos finitos. Isso abre oportunidades para a criação de novos empregos, a promoção da inovação, a redução de custos e o aumento da competitividade (Murray et al., 2017).

Quanto à sustentabilidade social, a EC tem o potencial de contribuir para a equidade social e a justiça, criando oportunidades de emprego, promovendo a inclusão social e contribuindo para a redução da pobreza (Moreau et al., 2017). Dessa forma, a transição para uma EC pode desempenhar um papel crucial na construção de sociedades mais justas e resilientes.

De tal maneira, temos que a EC emerge como uma abordagem promissora para alcançar a sustentabilidade em suas múltiplas dimensões: ambiental, econômica e social. Através do desenho de sistemas eficazes, a valorização de resíduos como recursos, a minimização do impacto ambiental e a promoção de uma economia regenerativa e resiliente, a EC tem o potencial de transformar nossa relação com o ambiente e com os recursos que ele fornece, apontando para um futuro mais sustentável e equitativo.

1.2 Diferença entre Economia Verde e Economia Circular

Compreender a diferença entre a economia verde e a economia circular requer um estudo aprofundado do significado, das nuances e das implicações de cada conceito. Ambos abordam o imperativo da sustentabilidade, mas diferem nas suas estratégias, abordagens e objetivos.

A economia verde, como definida pela United Nations Environment Programme (UNEP, 2011), é “uma economia que resulta na melhoria do bem-estar humano e na igualdade social, enquanto reduz significativamente os riscos ambientais e as escassezes ecológicas”. A economia verde está inextricavelmente ligada à ideia de desenvolvimento sustentável, enfatizando a necessidade de um crescimento econômico que seja ecologicamente sustentável e socialmente inclusivo. Embora a economia verde reconheça a necessidade de minimizar os impactos ambientais, ela ainda opera dentro do paradigma do crescimento econômico e procura equilibrar a necessidade de desenvolvimento com a necessidade de preservação ambiental.

A economia circular, por outro lado, é uma resposta direta às limitações da economia verde e do modelo econômico linear que ela busca moderar (ELLEN MACARTHUR FOUNDATION, 2013). Onde a economia verde procura minimizar os impactos negativos do modelo econômico linear, a economia circular procura substituí-lo completamente por um sistema fechado que é regenerativo por design. Ao contrário da economia verde, que ainda aceita a produção de resíduos como uma consequência inevitável do crescimento econômico, a economia circular procura eliminar completamente a ideia de resíduos. Em vez disso, na economia circular, todos os produtos são projetados para serem reutilizados, reciclados ou compostados, e a energia é obtida a partir de fontes renováveis.

Os princípios subjacentes à economia circular desafiam diretamente os pressupostos de que o crescimento econômico e a extração de recursos naturais estão necessariamente ligados (GEISSDOERFER et al., 2017). Na economia circular, a ideia é que o crescimento econômico possa ser alcançado através da otimização e reutilização de recursos já extraídos, em vez de através da extração contínua de novos recursos.

Apesar das diferenças entre a economia verde e a economia circular, ambas abordam a necessidade de mudança na forma como a economia funciona atualmente. Ambas buscam uma maneira de reconciliar a necessidade de desenvolvimento econômico com a necessidade de sustentabilidade ambiental. No entanto, cada uma oferece uma abordagem distinta sobre como isso pode ser alcançado. A economia verde se concentra na mitigação dos impactos do crescimento econômico, enquanto a economia circular busca uma reformulação fundamental do sistema econômico.

2. A ECONOMIA CIRCULAR COMO ESTRATÉGIA PARA COMBATER A POBREZA

A economia circular é frequentemente apontada como uma estratégia promissora para a sustentabilidade ambiental e para a promoção da eficiência de recursos. No entanto, o seu potencial como uma ferramenta para combater a pobreza e promover a equidade social é um aspecto que precisa ser mais explorado e compreendido. Isto é especialmente importante, considerando que a pobreza não é apenas uma condição de falta de recursos financeiros, mas também envolve a falta de acesso a recursos essenciais e oportunidades. É neste contexto que a economia circular pode desempenhar um papel fundamental, alinhando as necessidades de sustentabilidade ambiental com a promoção da inclusão social e da equidade.

A economia circular difere do modelo econômico convencional de produzir, consumir e descartar. Ao invés de seguir esse fluxo linear, a economia circular promove um sistema fechado, em que os recursos são continuamente reutilizados e reciclados, reduzindo a necessidade de extração de novos recursos. Ao mesmo tempo, a economia circular propõe a ideia de que nenhum produto deveria se tornar resíduo, e que todo resíduo deveria ser visto como um recurso potencial (Ellen MacArthur Foundation, 2013). Este paradigma implica uma mudança fundamental na forma como os recursos são utilizados, valorizados e gerenciados.

No entanto, a economia circular não deve ser vista apenas em termos de seu potencial para melhorar a eficiência dos recursos e reduzir o impacto ambiental. A transição para a economia circular também oferece oportunidades significativas para combater a pobreza e promover o desenvolvimento social. Por exemplo, a reutilização e reciclagem de resíduos podem gerar empregos e fornecer fontes de renda para comunidades marginalizadas (Ghisellini et al., 2016). Além disso, a economia circular pode estimular a inovação social e econômica, através da criação de novos modelos de negócios e oportunidades para empreendedorismo.

Também é crucial destacar que a economia circular pode contribuir para a redução da pobreza, não apenas através da criação de empregos, mas também através da redução dos custos de vida. Ao promover a reutilização e reciclagem, a economia circular pode ajudar a tornar os produtos e serviços mais acessíveis, diminuindo os custos para os consumidores, especialmente aqueles em situação de vulnerabilidade econômica.

No entanto, a implementação da economia circular como estratégia para combater a pobreza apresenta desafios significativos. A transição para a economia circular exige mudanças radicais nas práticas econômicas, na legislação e nas normas sociais. Além disso, para garantir que a economia circular beneficie os mais pobres, é necessário garantir que as políticas e práticas de economia circular sejam inclusivas e equitativas.

A interseção entre a economia circular e a pobreza é uma área emergente de pesquisa, e as implicações da economia circular na redução da pobreza estão começando a ser compreendidas. Conforme citado por Korhonen, Nuur, Feldmann e Birkie (2018), a economia circular pode ser uma força motriz significativa para a criação de empregos, e esse elemento é fundamental para a redução da pobreza.

O impacto mais imediato e tangível da economia circular na redução da pobreza é, sem dúvida, a geração de emprego e renda. À medida que a economia se move em direção a um modelo mais circular, novas oportunidades de trabalho surgem em diversas áreas, como reciclagem, reutilização, manutenção e reparo. O setor de gerenciamento de resíduos, em particular, tem sido destacado como uma fonte significativa de empregos em uma economia circular. Estima-se que, na União Europeia, a transição para uma economia circular poderia gerar 700.000 novos empregos até 2030 (EMF, 2015). Nos países em desenvolvimento, as atividades relacionadas à economia circular, como a coleta informal de resíduos, já fornecem meios de subsistência para milhões de pessoas (Wilson, Velis & Cheeseman, 2006).

Ademais, a economia circular pode ter um efeito redistributivo, beneficiando particularmente aqueles na parte inferior da escala econômica. Por exemplo, em uma economia circular, o valor dos produtos é mantido no ciclo econômico pelo maior tempo possível, o que pode tornar os bens duráveis mais acessíveis para as pessoas de baixa renda (Geissdoerfer, Savaget, Bocken & Hultink, 2017). Isso pode significar que as pessoas pobres têm acesso a produtos de maior qualidade a um custo mais baixo.

Além disso, a economia circular pode contribuir para a redução da pobreza através da inovação social. Os princípios da economia circular podem inspirar e dar forma a novas formas de organização social que promovem a inclusão social e a equidade. Por exemplo, as cooperativas de reciclagem, que organizam e empoderam os catadores de resíduos para melhorar sua renda e condições de trabalho, são um exemplo de como a economia circular pode levar à inovação social.

Ainda, é importante destacar que a economia circular também pode ter impactos indiretos na redução da pobreza. Por exemplo, ao minimizar a extração de recursos e a poluição, a economia circular pode contribuir para a proteção dos ecossistemas e dos serviços ambientais dos quais muitas pessoas pobres dependem para sua subsistência. No entanto, embora o potencial da economia circular para a redução da pobreza seja grande, também existem desafios significativos. A transição para a economia circular exige uma mudança sistêmica, que pode ser dificultada por obstáculos institucionais, legais e culturais. Além disso, para garantir que a economia circular beneficie os mais pobres, é necessário garantir que as políticas e práticas sejam inclusivas e equitativas.

Diversos modelos de economia circular têm demonstrado potencial significativo para promover a inclusão social e a geração de renda, ao mesmo tempo que preservam recursos naturais e reduzem os impactos ambientais. Através de uma abordagem multifacetada, estes modelos são capazes de enfrentar simultaneamente as questões de pobreza, desigualdade e sustentabilidade ambiental.

Um dos modelos mais importantes de economia circular é a reciclagem inclusiva, que envolve a incorporação formal de catadores de resíduos na gestão de resíduos sólidos urbanos. Este modelo tem sido aplicado com sucesso em várias cidades ao redor do mundo, oferecendo melhores condições de trabalho, acesso a serviços sociais e uma renda mais estável para os catadores de resíduos. Uma pesquisa realizada por Wilson, Velis e Cheeseman (2006) mostra que a reciclagem inclusiva pode ser uma estratégia eficaz para a redução da pobreza urbana.

Outro modelo significativo é o do empreendedorismo circular. Este modelo envolve a criação de novos negócios ou a adaptação de negócios existentes para operar de acordo com os princípios da economia circular, oferecendo produtos e serviços que minimizam o desperdício de recursos e maximizam o valor de recuperação. O empreendedorismo circular tem o potencial de criar novas oportunidades de emprego e geração de renda, ao mesmo tempo em que contribui para a sustentabilidade ambiental (Geissdoerfer, Savaget, Bocken & Hultink, 2017).

Além disso, o modelo de produção e consumo colaborativos, também conhecido como economia do compartilhamento, é outra manifestação da economia circular que pode promover a inclusão social e a geração de renda. Este modelo promove a partilha, reutilização, reparação, renovação e reciclagem de bens existentes, evitando a produção de novos bens. Ao mesmo tempo, pode criar novas oportunidades de trabalho e renda, especialmente para pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica.

Por último, a agricultura regenerativa é um modelo de economia circular que tem sido promovido como uma solução para a pobreza rural. Este modelo envolve a adoção de práticas agrícolas que regeneram o solo e os ecossistemas, ao mesmo tempo que proporcionam uma renda estável para os agricultores. A agricultura regenerativa tem o potencial de reduzir a pobreza rural, aumentar a segurança alimentar e mitigar as mudanças climáticas (Rhodes, 2017).

3. ECONOMIA CIRCULAR E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: UMA ABORDAGEM INTEGRADA

A transição para uma economia circular é cada vez mais reconhecida como um meio eficaz para reconciliar as metas de desenvolvimento econômico com as necessidades de sustentabilidade ambiental. Este tópico é dedicado à exploração da conexão intrínseca entre a economia circular e o desenvolvimento sustentável, destacando como uma abordagem integrada pode oferecer soluções pragmáticas e eficazes para os desafios multidimensionais da atualidade.

A economia circular é um modelo de produção e consumo que envolve o compartilhamento, a locação, a reutilização, a reparação, a renovação e a reciclagem de materiais e produtos existentes o máximo possível. Em outras palavras, é um sistema em que o valor dos produtos, materiais e recursos é mantido na economia por tanto tempo quanto possível, e a geração de resíduos é minimizada. Por sua vez, o desenvolvimento sustentável é um paradigma que busca equilibrar as necessidades de crescimento econômico, equidade social e integridade ambiental.

Ao adotar os princípios de fechamento de ciclo, a economia circular oferece um roteiro para desvincular o crescimento econômico do uso de recursos naturais e da degradação ambiental, abordando assim um dos principais desafios do desenvolvimento sustentável. Por meio da otimização do uso de recursos e da minimização de resíduos, a economia circular pode contribuir significativamente para a redução do impacto ambiental e para o aumento da eficiência econômica, ao mesmo tempo em que cria oportunidades para a inovação e a criação de empregos.

A adoção de uma economia circular também pode ter implicações significativas para a realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. Os princípios e práticas da economia circular abordam diretamente várias metas dos ODS, incluindo o consumo e a produção responsáveis, a ação climática, a vida abaixo da água, a vida terrestre e a parceria para os objetivos. No entanto, a transição para uma economia circular e o alcance do desenvolvimento sustentável requerem uma abordagem integrada que vá além dos limites setoriais e disciplinares. Esta abordagem deve levar em conta as interações complexas entre os sistemas econômicos, ambientais e sociais e deve envolver uma ampla gama de atores, incluindo governos, empresas, organizações da sociedade civil e cidadãos. Além disso, deve se basear em uma compreensão sólida da ciência dos sistemas e em uma avaliação rigorosa dos impactos e trade-offs.

3.1 Economia Circular e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)

A adoção e implementação dos princípios da Economia Circular têm uma contribuição substancial para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), um conjunto de 17 metas globais estabelecidas pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2015, que visa direcionar esforços em direção a um futuro mais sustentável para todos.

a) A Economia Circular e a ODS 12

Em particular, a economia circular apoia os ODS de várias maneiras. Primeiro, a economia circular contribui para o Objetivo 12, que busca “assegurar padrões de consumo e produção sustentáveis”. Os princípios da economia circular, que defendem o uso eficiente dos recursos através da redução, reutilização e reciclagem, se alinham perfeitamente com esse objetivo. Ao otimizar o ciclo de vida dos produtos, minimizando a dependência de novos recursos e reduzindo a quantidade de resíduos, a economia circular ajuda a promover práticas de consumo e produção mais sustentáveis.

O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 12 (ODS 12) visa garantir padrões de consumo e produção sustentáveis, o que é fundamental para reduzir a pegada ecológica da humanidade e promover uma economia global mais justa e resiliente. A economia circular, com seus princípios de redução, reutilização e reciclagem, desempenha um papel crucial na realização deste objetivo.

Primeiramente, a redução se refere à minimização do consumo de recursos e do desperdício na fase de produção. Isso é alcançado através do design eficiente de produtos, da otimização de processos e da implementação de tecnologias inovadoras. Por exemplo, no design de produtos, a economia circular incentiva a criação de produtos duráveis, reparáveis e atualizáveis, reduzindo a necessidade de substituição frequente e, consequentemente, a demanda por novos recursos. Na produção, a economia circular defende a eficiência energética e a redução do desperdício através de práticas como a manufatura enxuta.

Em segundo lugar, a reutilização implica a extensão do ciclo de vida dos produtos e materiais tanto quanto possível. Isso é facilitado pelo design para desmontagem e pela promoção de modelos de negócios que incentivem a reutilização, como a economia compartilhada. A reutilização ajuda a diminuir a demanda por novos produtos, reduzindo assim a pressão sobre os recursos naturais e os ecossistemas.

Em terceiro lugar, a reciclagem envolve a recuperação e reprocessamento de resíduos em novos materiais ou produtos. Isso permite que os recursos sejam mantidos no ciclo econômico por mais tempo e minimiza a necessidade de extração de novos materiais. A reciclagem também ajuda a diminuir a quantidade de resíduos que acabam em aterros ou são incinerados, reduzindo assim a poluição e as emissões de gases de efeito estufa.

Ao promover esses três princípios, a economia circular contribui para a transformação dos sistemas de consumo e produção, tornando-os mais eficientes, resilientes e sustentáveis. Esta abordagem ajuda a desvincular o crescimento econômico do consumo de recursos, permitindo que a prosperidade seja alcançada de uma maneira que respeite os limites do nosso planeta.

Além disso, a economia circular também aborda a necessidade de mudança nos comportamentos de consumo. Ela promove a responsabilidade do consumidor e a conscientização sobre os impactos do consumo, incentivando práticas mais sustentáveis como a compra de produtos reciclados ou reutilizados, a participação na economia compartilhada e a redução do desperdício.

b) A Economia Circular e a ODS 13

A economia circular também está diretamente relacionada ao Objetivo 13, que pede “ações urgentes para combater a mudança climática e seus impactos”. Ao promover uma transição da economia linear “extrair, fabricar, descartar” para um modelo circular, podemos reduzir significativamente as emissões de gases de efeito estufa associadas à extração e ao processamento de recursos, bem como à gestão de resíduos.

A economia circular está intimamente ligada ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 13 (ODS 13), que apela para ações urgentes para combater a mudança climática e seus impactos. Este objetivo enfatiza a necessidade de tomar medidas decisivas e concretas para lidar com um dos maiores desafios globais de nosso tempo. Aqui, o modelo da economia circular se torna um instrumento de extrema importância, pois apresenta uma solução eficaz para reduzir significativamente as emissões de gases de efeito estufa.

A economia linear tradicional, caracterizada pelo modelo “extrair, fabricar, descartar”, é uma das principais causas das mudanças climáticas. Este modelo depende fortemente da extração de recursos naturais, resultando em grandes quantidades de emissões de gases de efeito estufa tanto na fase de extração quanto na de processamento. Além disso, a disposição final dos produtos no final de seu ciclo de vida, especialmente por meio de aterros e incineração, também contribui para as emissões de gases de efeito estufa.

Por outro lado, a economia circular busca transformar este modelo linear em um sistema fechado, onde os recursos são mantidos no ciclo econômico pelo maior tempo possível. Isso é alcançado através da redução do consumo de recursos, da reutilização de produtos e materiais e da reciclagem de resíduos. Essas estratégias contribuem para a redução das emissões de gases de efeito estufa de várias maneiras.

Primeiro, a redução do consumo de recursos leva a uma diminuição nas emissões de gases de efeito estufa provenientes da extração e processamento de recursos. Por exemplo, o design de produtos duráveis e eficientes em termos de recursos e a otimização dos processos de produção podem resultar em menos demanda por novos recursos e, portanto, em menos emissões associadas à sua extração e processamento.

Segundo, a reutilização de produtos e materiais também ajuda a evitar as emissões de gases de efeito estufa associadas à produção de novos produtos. Além disso, a reutilização pode prolongar o ciclo de vida dos produtos, reduzindo a quantidade de resíduos que precisam ser descartados.

Terceiro, a reciclagem de resíduos permite a recuperação e o reprocessamento de materiais em novos produtos, evitando as emissões de gases de efeito estufa associadas à extração e processamento de novos recursos. Além disso, a gestão apropriada dos resíduos através da reciclagem pode evitar as emissões de metano, um poderoso gás de efeito estufa, que é liberado quando os resíduos orgânicos se decompõem em aterros.

c) A Economia Circular e a ODS 8

O Objetivo 8, que visa “promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e o trabalho decente para todos”, também é apoiado pela economia circular. A transição para uma economia circular pode levar à criação de novos empregos e oportunidades de negócios, ao mesmo tempo em que promove uma economia mais resiliente e sustentável.

O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 8 (ODS 8), que se dedica a promover o crescimento econômico inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e o trabalho decente para todos, está intrinsecamente alinhado aos princípios da economia circular. Nesse contexto, a transição para a economia circular não apenas possibilita a mitigação dos impactos ambientais, mas também proporciona oportunidades significativas para o crescimento econômico, a criação de empregos e o desenvolvimento social.

A economia circular repensa o tradicional modelo linear de “extrair, produzir, descartar” e propõe um sistema que minimiza o consumo e o desperdício de recursos, mantendo-os em uso pelo maior tempo possível. Esta transformação requer uma gama diversificada de habilidades e conhecimentos, e a implementação efetiva do modelo de economia circular pode resultar na criação de uma série de novos empregos e oportunidades de negócios em diversos setores.

Em primeiro lugar, a necessidade de desenhar produtos para serem mais duráveis, reparáveis e recicláveis, pode gerar demanda em áreas como pesquisa e desenvolvimento, design de produto e engenharia. Além disso, modelos de negócio baseados em serviços, onde os produtos são oferecidos como um serviço em vez de serem vendidos, podem também levar ao surgimento de novas oportunidades de negócios.

Em segundo lugar, a ênfase na reutilização e reciclagem de materiais e produtos cria oportunidades de emprego nos setores de coleta, processamento e venda de resíduos. Este setor de reciclagem pode gerar empregos tanto na coleta quanto no processamento de resíduos, além de criar novos mercados para produtos reciclados. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, o setor de resíduos tem um potencial significativo para a criação de empregos verdes e decentes.

Em terceiro lugar, a transição para uma economia circular também pode promover a inovação e o empreendedorismo. A necessidade de desenvolver novas tecnologias, produtos e serviços para facilitar a circularidade pode abrir espaço para start-ups e inovadores que oferecem soluções de economia circular.

Finalmente, a economia circular pode contribuir para uma economia mais resiliente e sustentável. Ao reduzir a dependência de recursos não renováveis, as empresas podem aumentar sua resiliência a choques de preço e interrupções no fornecimento. Além disso, a diversificação dos fluxos de receita, através de serviços de produto e mercados secundários, pode também promover a estabilidade econômica. No entanto, é fundamental ressaltar que a transição para uma economia circular deve ser conduzida de uma maneira que promova o trabalho decente e não perpetue desigualdades existentes. Para isso, são necessárias políticas e regulamentações apropriadas para garantir a proteção dos trabalhadores e a equidade na distribuição dos benefícios da economia circular.

d) A Economia Circular e a ODS 9

A Economia Circular também contribui para o Objetivo 9, que busca “construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação”. Os princípios da economia circular incentivam a inovação em termos de design de produto, processos de produção, modelos de negócios e políticas públicas.

O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 9 (ODS 9) foca na construção de infraestruturas resilientes, na promoção da industrialização inclusiva e sustentável e no fomento à inovação. A economia circular, com seus princípios de redução, reutilização e reciclagem, tem uma relação simbiótica com este objetivo, uma vez que a transição para um modelo econômico circular requer e promove inovação em design de produto, processos de produção, modelos de negócios e políticas públicas.

Em primeiro lugar, no âmbito da infraestrutura resiliente, a economia circular enfatiza o uso eficiente e eficaz dos recursos, o que se traduz na criação e manutenção de infraestruturas projetadas para minimizar o uso de recursos, enquanto maximizam a sua vida útil. Isso implica, por exemplo, no desenvolvimento de infraestruturas modulares que possam ser atualizadas ou substituídas facilmente sem a necessidade de substituir a infraestrutura como um todo. Além disso, a economia circular também promove a criação de infraestruturas que facilitem a coleta e reciclagem de resíduos, o que ajuda a transformar resíduos em recursos, criando um ciclo de vida mais longo e mais sustentável para os materiais.

Em segundo lugar, no que se refere à industrialização inclusiva e sustentável, a economia circular oferece um modelo que reduz o impacto ambiental da produção industrial e a dependência de recursos finitos. Através do design de produtos para reutilização, reparação e reciclagem, e a utilização de materiais reciclados em novos produtos, a economia circular contribui para a redução da pegada ambiental da indústria. Além disso, ao incluir todos os atores ao longo da cadeia de valor em seus processos, a economia circular promove uma industrialização que é mais inclusiva, abrindo novas oportunidades de emprego e de negócios.

Em terceiro lugar, o fomento à inovação é um componente fundamental da economia circular. A necessidade de repensar como os produtos são projetados, produzidos, utilizados e descartados leva a inovações significativas em todas essas áreas. Isso inclui inovações no design de produtos para torná-los mais duráveis, reparáveis e recicláveis, inovações nos processos de produção para torná-los mais eficientes e menos poluentes, inovações em modelos de negócios para permitir a reutilização e a reciclagem de produtos e inovações em políticas públicas para apoiar e incentivar a transição para a economia circular.

Além disso, a economia circular promove a inovação aberta e a colaboração entre os atores ao longo da cadeia de valor, o que pode levar a avanços mais rápidos e a soluções mais eficazes. Ao permitir o compartilhamento de conhecimentos e recursos, a economia circular pode acelerar o desenvolvimento de tecnologias e práticas sustentáveis.

e) A Economia Circular e as ODS 6 e 14

Além disso, a transição para uma economia circular tem potencial para contribuir para a realização do Objetivo 6 “garantir a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos” e do Objetivo 14 “conservar e usar de forma sustentável os oceanos, os mares e os recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável”, minimizando a poluição da água e melhorando a gestão de resíduos.

A economia circular, por sua natureza, é uma abordagem holística que busca otimizar o uso de recursos em todos os aspectos do nosso sistema econômico. Portanto, a transição para uma economia circular tem implicações significativas para a gestão sustentável da água (Objetivo 6) e para a conservação dos oceanos (Objetivo 14).

Começando pelo Objetivo 6, a economia circular promove a eficiência no uso da água através do reuso e da reciclagem. Em muitas indústrias, a água é um insumo chave e o seu uso pode ser otimizado através de tecnologias de reciclagem e reuso. Isso permite a criação de sistemas fechados onde a água é constantemente reutilizada, minimizando a necessidade de captação de água fresca. Além disso, a economia circular incentiva o design de produtos e processos que minimizam o uso de água, contribuindo para uma gestão mais sustentável desse recurso vital.

A economia circular também pode melhorar a qualidade da água através de uma gestão de resíduos mais eficiente. Muitos processos industriais geram resíduos líquidos que, se não tratados adequadamente, podem contaminar os corpos d’água. A economia circular promove o tratamento e a reciclagem desses resíduos, transformando-os em recursos úteis em vez de contaminantes.

Quanto ao Objetivo 14, a economia circular tem um papel crucial na redução da poluição dos oceanos. Um dos maiores problemas que afetam os nossos mares é o acúmulo de resíduos plásticos, uma consequência direta do nosso sistema econômico linear atual. A economia circular busca combater esse problema através de duas estratégias principais: primeiro, incentivando o design de produtos para durabilidade, reutilização e reciclagem, reduzindo a quantidade de resíduos que acabam nos oceanos; e segundo, promovendo a reciclagem e a compostagem de resíduos, transformando-os em novos recursos em vez de permitir que se tornem poluentes marinhos.

Além disso, a economia circular promove a inovação em áreas como a biotecnologia, que pode levar ao desenvolvimento de novas soluções para a recuperação e conservação dos oceanos. Por exemplo, a biotecnologia marinha pode nos permitir explorar e utilizar os recursos do oceano de forma mais sustentável, contribuindo para o cumprimento do Objetivo 14.

f) Conclusão parcial sobre a Economia Circular e as ODS

É importante notar que, embora a economia circular possa contribuir para a realização dos ODS, a transição para uma economia circular não é uma solução mágica e requer uma mudança fundamental na maneira como produzimos e consumimos. Ela exige a cooperação de todos os setores da sociedade, incluindo governos, empresas, academia e sociedade civil, bem como um entendimento claro das interdependências complexas entre os vários ODS e o equilíbrio necessário para evitar comprometer alguns ODS enquanto se trabalha para alcançar outros.

Assim, embora a economia circular seja uma estratégia promissora para o desenvolvimento sustentável, sua implementação deve ser acompanhada de uma análise cuidadosa dos possíveis trade-offs e de um compromisso firme com a equidade, a inclusão e a justiça social. Por último, mas não menos importante, a transição para uma economia circular deve ser baseada em evidências científicas sólidas e apoiada por um quadro político adequado que promova a inovação e a cooperação entre os diferentes atores.

3.2 A Implementação da Economia Circular no Contexto do Desenvolvimento Sustentável

A implementação da economia circular no contexto do desenvolvimento sustentável apresenta uma abordagem holística e integrada para tratar os desafios ambientais, sociais e econômicos que o mundo enfrenta atualmente. Esta abordagem tem potencial para transformar nossa economia linear tradicional em um sistema regenerativo e resiliente que promove a sustentabilidade em longo prazo.

Uma das principais maneiras de implementar a economia circular é por meio do design de produtos. O design circular propõe uma reformulação dos produtos, de modo que sejam projetados para ter uma vida útil mais longa, possam ser facilmente reparados, reutilizados e, por fim, reciclados em novos produtos. A economia circular promove o design de produtos modulares que podem ser desmontados e remontados, permitindo que as partes danificadas sejam substituídas em vez de descartar todo o produto. Essa prática reduz a quantidade de resíduos gerados e diminui a dependência de recursos naturais, pois menos materiais são necessários para a fabricação de novos produtos (Bocken et al., 2016).

A implementação da economia circular também envolve a mudança dos modelos de negócios. Modelos baseados no uso, em vez da posse, são cada vez mais comuns em uma economia circular. Estes incluem sistemas de aluguel, compartilhamento, leasing e serviços, nos quais os consumidores pagam pelo uso do produto, em vez de sua posse. Esses modelos de negócios incentivam o uso mais eficiente dos produtos, prolongam sua vida útil e reduzem a quantidade de resíduos produzidos (Lewandowski, 2016).

A inovação na tecnologia de processamento e reciclagem é outra área crucial para a implementação da economia circular. A reciclagem é uma prática importante que transforma resíduos em novos produtos, reduzindo a necessidade de extrair novos recursos. As inovações tecnológicas podem melhorar a eficiência da reciclagem e possibilitar a reciclagem de materiais que atualmente são difíceis de reciclar. Além disso, a digitalização e as tecnologias emergentes, como a Internet das Coisas, Inteligência Artificial e blockchain, podem desempenhar um papel significativo na facilitação da implementação da economia circular, melhorando a rastreabilidade dos materiais, aumentando a eficiência do processo e possibilitando novos modelos de negócios (Geissdoerfer et al., 2017).

A implementação da economia circular requer um enquadramento político adequado. As políticas governamentais podem incentivar a economia circular por meio de regulamentações, impostos e subsídios que incentivem práticas sustentáveis, como o design de produtos para durabilidade e reciclabilidade, a promoção de modelos de negócios circulares e a inovação na reciclagem (Kirchherr et al., 2017).

É importante salientar que a transição para uma economia circular deve ser inclusiva e justa, levando em conta os impactos sociais. Isso envolve a garantia de que a transição não resulte na perda de empregos, mas na criação de novos empregos verdes e na promoção de práticas laborais justas. Além disso, a economia circular deve ser implementada de forma que beneficie todas as camadas da sociedade, reduzindo a pobreza e promovendo a inclusão social (Korhonen et al., 2018).

O conceito de economia circular promete oportunidades significativas para o desenvolvimento sustentável, mas também enfrenta uma série de desafios práticos e teóricos. Vamos começar com as oportunidades:

A economia circular tem o potencial de transformar a economia global de uma maneira que melhora a eficiência dos recursos, reduz o impacto ambiental, cria empregos e contribui para a inovação (Webster, 2015). Em primeiro lugar, ao reutilizar, reciclar e regenerar produtos e materiais, a economia circular reduz a necessidade de extração e consumo de recursos naturais, promovendo uma maior eficiência dos recursos (Geissdoerfer et al., 2017).

Além disso, a economia circular pode ajudar a reduzir o impacto ambiental. Ao promover práticas como a reutilização e reciclagem, a economia circular minimiza a quantidade de resíduos que acabam em aterros sanitários e no meio ambiente. Além disso, ao reduzir a necessidade de extração de recursos naturais, a economia circular pode minimizar a perda de biodiversidade e os impactos ambientais associados à mineração e extração (Bocken et al., 2016).

Outro benefício da economia circular é a criação de empregos. Ao promover novos modelos de negócios baseados na reutilização, reparo e reciclagem, a economia circular tem o potencial de criar novos empregos, particularmente em setores como manufatura, reparo e reciclagem (Stahel, 2016). Isso pode contribuir para uma maior inclusão social e redução da pobreza.

Além disso, a economia circular pode promover a inovação. Ao incentivar o design de produtos modulares e recicláveis e a adoção de novos modelos de negócios, a economia circular pode levar a avanços significativos em termos de inovação tecnológica e de negócios (Geissdoerfer et al., 2017).

No entanto, a economia circular também enfrenta uma série de desafios. Um dos principais desafios é a necessidade de mudança de mentalidade. A transição para uma economia circular requer uma mudança fundamental na maneira como produzimos e consumimos produtos. Isso inclui a adoção de uma mentalidade de “cradle-to-cradle” (do berço ao berço) em vez de uma mentalidade de “cradle-to-grave” (do berço ao túmulo), e a aceitação de modelos de negócios baseados no uso em vez da posse (Webster, 2015).

Outro desafio é a falta de infraestrutura e tecnologia para apoiar a economia circular. Isso inclui a falta de instalações de reciclagem eficientes e infraestrutura para a coleta e transporte de resíduos, bem como a falta de tecnologia para a desmontagem e reciclagem de produtos complexos (Ghisellini et al., 2016).

Há também desafios regulatórios e políticos. A implementação da economia circular requer um quadro regulatório que incentive práticas como a reutilização e reciclagem e desincentive práticas insustentáveis. Isso pode incluir regulamentações que exijam o design de produtos recicláveis, impostos sobre a extração de recursos naturais, e incentivos para práticas de negócios circulares (Geissdoerfer et al., 2017).

Por conseguinte, quanto aos fatos analisados, verificamos que, no mesmo passo em que a economia circular apresenta significativas oportunidades para o desenvolvimento sustentável, também enfrenta uma série de desafios. No entanto, com a mentalidade certa, a infraestrutura adequada, a tecnologia avançada, e o quadro regulatório adequado, a transição para uma economia circular é não só possível, mas também necessária para alcançar um futuro mais sustentável.

4. CONCLUSÃO

A transição da economia linear para uma economia circular é mais do que um movimento ambiental; é uma transformação que tem o potencial de remodelar a economia global e contribuir significativamente para os esforços globais de desenvolvimento sustentável. O presente artigo compreendeu uma completa e aprofundada análise e revisão de ampla literatura internacional, apresentando um estudo abrangente da economia circular, e demonstrando como a implementação de seus princípios pode conduzir a sociedade rumo a um futuro mais resiliente, equitativo e sustentável.

A economia circular, como foi abordado neste artigo, representa uma mudança paradigmática na maneira como os recursos são utilizados, valorizados e reutilizados. Na economia circular, os resíduos se tornam recursos e a eficiência do uso dos recursos se torna central. Este novo paradigma tem o potencial de reduzir a pressão sobre o meio ambiente, minimizar a perda de biodiversidade e diminuir a emissão de gases de efeito estufa.

A análise também apresentou uma visão detalhada de como a economia circular se relaciona com a sustentabilidade e como ela difere da economia verde. Enquanto a economia verde enfoca o crescimento econômico sustentável, a economia circular vai além e busca eliminar completamente o conceito de resíduo através da criação de sistemas fechados de fluxo de materiais.

Foi também discutida a ligação entre a economia circular e a redução da pobreza. Os modelos de economia circular podem oferecer oportunidades de geração de renda e inclusão social, abordando simultaneamente questões ambientais. Esta discussão reforçou o papel fundamental que a economia circular pode desempenhar no cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, particularmente aqueles relacionados à redução da pobreza, ao trabalho decente e ao crescimento econômico, à produção e consumo responsáveis, e à ação climática.

A análise também destacou o papel da economia circular no contexto do desenvolvimento sustentável. Através da incorporação de princípios de economia circular, os países podem avançar em direção ao cumprimento dos ODS, abordando questões relacionadas à infraestrutura, industrialização e inovação.

Por fim, foram discutidos os desafios e oportunidades da implementação da economia circular. Embora a transição para a economia circular apresente desafios significativos, incluindo a necessidade de mudança de mentalidade, falta de infraestrutura e tecnologia e desafios regulatórios, as oportunidades são consideráveis. A economia circular pode promover a eficiência dos recursos, a resiliência econômica, a inovação, a geração de empregos e a redução do impacto ambiental.

Por todo o apresentado neste artigo científico, conclui-se que a transição para uma economia circular é uma necessidade urgente e uma oportunidade significativa para alcançar um desenvolvimento mais sustentável. Embora existam desafios no caminho, a adoção de práticas de economia circular é uma abordagem promissora para enfrentar algumas das questões mais prementes do nosso tempo, incluindo a escassez de recursos, as mudanças climáticas, a pobreza e a desigualdade. Este estudo esperamos que sirva como um chamado para a ação para pesquisadores, formuladores de políticas, empresários e cidadãos, para colaborar e trabalhar em direção a uma transição para uma economia mais circular e, portanto, mais sustentável.

REFERÊNCIAS

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[1] Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais. Mestre em Direito e Desenvolvimento Sustentável pelo Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ. Especialização em Direito da Seguridade Social – Previdenciário e Prática Previdenciária. Especialização em Advocacia Extrajudicial. Especialização em Coordenação Pedagógica. Especialização em Direito da Criança, Juventude e Idosos. Especialização em Direito Educacional. Especialização em Tutoria em Educação a Distância e Docência do Ensino Superior. Especialização em Direito do Consumidor. Especialização em Direito Civil, Processo Civil e Direito do Consumidor. Especialização em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho. Formação Pedagógica em andamento em Geografia. Formação Pedagógica em andamento em Ciências Biológicas. Graduação em Direito. Editor de Livros, Revistas e Sites. Advogado. Coordenador Pedagógico e Professor do Departamento de Pós-Graduação em Direito do Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ; Professor convidado da Escola Nacional de Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça; Professor do Curso de Graduação em Direito no Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ; Membro Coordenador Editorial de Livros Jurídicos da Editora Edijur (São Paulo); Membro Diretor Geral e Editorial das seguintes Revistas Científicas: Scientia et Ratio; Revista Brasileira de Direito do Consumidor; Revista Brasileira de Direito e Processo Civil; Revista Brasileira de Direito Imobiliário; Revista Brasileira de Direito Penal; Revista Científica Jurídica Cognitio Juris, ISSN 2236-3009; e Ciência Jurídica; Membro do Conselho Editorial da Revista Luso-Brasileira de Direito do Consumo, ISSN 2237-1168; Autor de mais de 90 livros jurídicos e de diversos artigos científicos.